As cidades ou as regiões adquirem fama, pelas suas manifestações
religiosas, seu folclore, culinária, modo de falar. Algumas ficam
conhecidas pelo jeito de ser de seu povo, gente expansiva ou reservada,
com cartas “guardadas na manga” para serem jogadas em tempo oportuno. Há
lugares, como Nazaré, onde viveu Jesus com Maria e José, que ficaram
conhecidos como terra de gente brava e até revoltada. Qualquer
provocação servia para um levante, tanto que Jesus, conhecido como
Nazareno, suscitava desconfiança em muitas pessoas, também porque as
tradições não esperavam que pudesse vir da Galileia algum profeta. Pode
acontecer também entre nós, pela avalanche de violência aliada à
impunidade corrente, que se reforce a pecha de sermos hoje uma das áreas
perigosas do país. Não é difícil perceber como contribuímos para isso,
pela facilidade com que classificamos áreas de nossa região
metropolitana como “vermelhas” ou perigosas, vendo em cada desconhecido
uma ameaça.
A Igreja quer enfrentar com as armas do
Evangelho todas as situações desafiadoras, vencendo por amor e com amor,
penetrando em todos os ambientes e superando preconceitos. Nosso
projeto de Evangelização quer alcançar os que estão afastados da Igreja
ou se sentem distantes, constituindo novas Comunidades de fé nos lugares
mais difíceis. Mais do que as eventuais estatísticas, interessa-nos
dizer que todos são amados por Deus e candidatos à vida plena e à
salvação, não nos sendo lícito arrefecer diante dos obstáculos. Vale a
pena abrir os olhos e verificar como o espírito missionário já envolve
muitos sacerdotes, diáconos, religiosos e religiosas, pessoas dedicadas a
Deus e, mais ainda, uma enorme quantidade de cristãos leigos e leigas.
Vamos chegar lá, contagiando muita gente com a unção missionária.
E os Bispos da Região Amazônica,
reunidos nesta semana em Santarém, renovaram suas disposições
missionárias, para que a boa nova alcance a todos em todos os rincões de
nossa terra. Saíram de lá com renovado entusiasmo a ser comunicado a
todo o povo de Deus.
Voltando a Nazaré, ali Jesus ficou
conhecido como carpinteiro, pois havia apreendido de São José este
ofício tão digno quanto importante (Mc 6,1-6). Parece até que
carpinteiro era mais do que o oficial das mesas ou cadeiras, mas um
daqueles homens que sabiam fazer de tudo na construção de uma casa.
Ainda se encontram pessoas assim por aí, com admirável conhecimento
prático, de olhar profundo e prudência, calma no trabalho, poucas
palavras e muita ação. Dá para pensar no Pai do Céu, contemplando a
beleza e a bondade da criação, como descreve o livro do Gênesis.
Sendo Jesus homem verdadeiro e Deus
verdadeiro, tudo o que realizava envolvia a totalidade da vida humana,
sem excluir qualquer área dos sentimentos e das aspirações das pessoas,
tanto que ninguém passava em vão ao seu lado. Ele que fazia bem todas as
coisas. E era o Carpinteiro de Nazaré! Aproximar-se dele é descobrir o
seu segredo, pois o Carpinteiro é Profeta, é Messias, é Salvador.
Ter contato com Jesus Cristo é
contemplá-lo na fé, apurando nosso sentido sobrenatural, a fim de que a
salvação seja acolhida e nossa vida transformada. Nele, aprendemos a
olhar também em torno a nós, para valorizar os pequenos gestos e as
pessoas que conosco convivem. Há um grito surdo pela valorização das
pessoas, na superação de desconfianças e medos. É urgente dar nome de
dignidade às pessoas que transbordam simplicidade e com ela a sabedoria.
Elas estão aí, bem perto de nós. Muitas constroem frases quase
ingênuas, que alguns pensam ser sabedoria de para-choque de caminhão!
Outras sabem dar respostas precisas, ou sabem ouvir e prestar atenção
como ninguém, para tudo guardar num coração bom e puro.
Sabemos que quem segue Jesus,
independente de sua condição social, idade ou cultura, passa a fazer
parte do evangelho, da história de Deus. Se o próprio Senhor teve
dificuldades com alguns grupos, como os habitantes de Nazaré, onde ele
se tinha criado (Mc 6,1-6), sabemos que ele inicia uma nova família,
destinada a edificar um novo mundo (Mc 3,13-6,13), na superação das
distâncias entre as pessoas, formada por quem quer realizar a vontade do
Pai (Mc 3,35). Os discípulos de ontem e de hoje têm a missão de estar
com Jesus e ser enviados por ele, como companheiros de missão, na luta
contra o mal.
Ao tornar-se simples e competente
carpinteiro em Nazaré, o Salvador entrou nas estruturas humanas para
transformá-las. A liturgia nos faz reconhecer que pela humilhação do
Filho amado, o Pai reergueu o mundo decaído (Cf. Oração do XIV Domingo
Comum). Ele ocupou todos os espaços humanos com sua presença redentora.
Tal constatação de fé nos permite acolher o dom da alegria nesta terra e
almejar as alegrias eternas.
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém/PA
Assessor eclesiástico da RCCBRASIL
Arcebispo de Belém/PA
Assessor eclesiástico da RCCBRASIL
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